Vinho varietal e de corte são definições que indicam a quantidade de uvas presente na composição do vinho. Vinho varietal é feito a partir de uma única variedade de uva. Já o vinho de corte, também conhecido como vinho blend, é feito a partir da combinação de duas ou mais variedades de uva diferentes.
Escrito por Paula Daidone - Sommelière e especialista em marketing de vinhos
O que é um vinho varietal?
O varietal é um tipo de vinho elaborado apenas com uma única variedade de uva, por isso, também é chamado de monocasta ou monovarietal. Para ser classificado como varietal, o vinho precisa ter predominância de determinada uva. No Brasil, para o vinho ser considerado varietal, deve conter, ao menos, 75% de uma única variedade. Os outros 25% não precisam ser discriminados no rótulo. Essa regra também é aplicada no Chile, Califórnia e Nova Zelândia. Já na África do Sul, Austrália e na Alemanha, para que o vinho se enquadre nessa categoria, é necessário ter, pelo menos, 85% de uma única variedade.
Veja alguns tipos de uva:
- Merlot
- Tannat
- Malbec
Cada país indica a porcentagem permitida de outras castas em um varietal. Essa lacuna é de extrema importância na elaboração do vinho varietal. Como se trata de um vinho de apenas uma casta, é necessário que a fruta apresente sanidade e maturação perfeita. Isso é um grande desafio para o enólogo, pois ele depende totalmente da natureza para que a fruta atinja os níveis ideais. Caso ocorra algum imprevisto na vinha ou alguma intempérie climática, a produção pode estar arriscada. Por isso, a legislação de muitos países do mundo permite a utilização de uma pequena quantidade de outras cepas, para que assim, o enólogo possa utilizar outras variedades para "corrigir" o vinho.
Por exemplo, o enólogo irá elaborar um varietal de Pinot Noir, mas naquele ano o clima foi muito frio e a fruta não madurou por completo. Como resultado, uma uva com pouco álcool, baixa carga de taninos, acidez elevada e muito aroma de vegetais verdes. Caso ele decida fazer o vinho apenas com essa Pinot Noir, provavelmente terá um produto desequilibrado e com menor qualidade.
Para que isso não aconteça, o enólogo pode lançar mão de outras variedades que corrijam esses pontos. Ele pode escolher as uvas com melhor maturação e que apresentam pontos opostos ao problema identificado para inserir no vinho. Respeitando a margem dos 25%, pode ser inserida a quantidade de variedades necessárias. Por exemplo, o enólogo pode optar por colocar uma porcentagem de Malbec para dar aroma de frutas pretas ao vinho, incluir Merlot para equilibrar o tanino e Cabernet Sauvignon para dar corpo e álcool. Ele cria uma mistura que funcionará como um “melhorador”, assim não é necessário utilizar aditivos enológicos.
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Como surgiram os vinhos varietais?
Os vinhos varietais surgiram junto com a criação do vinho. Mas a classificação começou a ser empregada quando regiões vitivinícolas criaram suas legislações, definindo quais uvas poderiam ser utilizadas. Como é o caso de Borgonha, na França, em 1936, com o registro da Denominação de Origem, ficou definido que os vinhos produzidos ali só poderiam utilizar as uvas Pinot Noir, para os tintos, e Chardonnay, para os brancos. Outra renomada região que definiu ser varietal foi Barolo, na Itália, por lá, o vinho só pode levar a uva Nebbiolo em sua composição.
Mesmo sendo regiões com apenas uma uva, você irá encontrar no rótulo o nome do lugar em que o vinho foi produzido e não da variedade. Na Europa, a zona onde as uvas foram cultivadas tem mais relevância que a própria casta. Então, muitas vezes, você pode estar consumindo um vinho varietal sem nem saber. Exibir a uva no rótulo é algo recente e muito impulsionado pelos Estados Unidos, que vislumbraram uma oportunidade de marketing. Exibir no rótulo o nome das uvas era uma forma de mostrar que estavam utilizando as mesmas variedades que os grandes produtores europeus.
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Usar o nome da uva virou tendência entre as vinícolas do Novo Mundo (toda região que está fora da Europa) e pautou o novo consumidor, que passou a conhecer o vinho pela uva e não mais a região. Esse movimento foi tão forte que provocou um caminho inverso: produtores da Europa estão incluindo em seus rótulos o nome da variedade, para que o consumidor crie uma identificação com o produto. Nos dias de hoje é comum encontrar no Brasil rótulos europeus que possuem o nome da região e o nome da uva.
O que é um vinho de corte?
Corte é um vinho elaborado com duas ou mais variedades de uva. Pode ser chamado de blend, lote ou assemblage. Para se encaixar nessa categoria, basta o produtor elencar no rótulo ou na ficha técnica as uvas utilizadas. A definição de qual e de quantas uvas farão parte do corte pode ser do enólogo ou da legislação em vigor na região de produção. Zonas protegidas por Denominação de Origem têm definido por lei quais as castas autorizadas e a quantidade mínima ou máxima para cada uma. Áreas que não estão encobertas por DO, têm total liberdade para criar o blend.
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A escolha das uvas que compõem o blend está associada ao estilo de vinho da região ou do produtor. Isso vale para as zonas com DO, as uvas, para entrar na legislação, foram selecionadas de acordo com características específicas que aportaram ao vinho. Criar um blend é quase que uma alquimia. O enólogo precisa estar muito atento ao processo, para identificar qual uva e em qual quantidade estará presente na mistura, de acordo com o que ele quer evidenciar ou esconder. É justamente a dosagem de cada castas que dará equilíbrio ao vinho.
A grande maioria das regiões europeias com Denominação de Origem admitem a produção de blends. Portugal, por exemplo, é o único país em que todas as áreas vitivinícolas estão autorizadas a criar vinhos de corte. Châteauneuf-du-Pape, na França, é uma área exclusiva para blend e por lá está autorizada a utilização de 14 castas tintas: Grenache Noir, Syrah, Mourvèdre, Cinsault, Clairette, Vaccarèse, Bourboulenc, Roussanne, Counoise, Muscardin, Picpoul, Picardan e Terret Noir.
Bordeaux, na França, é a região mais reconhecida pela produção de blend. Produtores do mundo inteiro criam vinhos seguindo o padrão do corte bordalês, que inclui as castas, Merlot, Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc (as mais utilizadas), Cabernet Franc, Petit Verdot, Malbec e Carménère. Por conta da mudança climática, em 2021, foi autorizada a utilização de quatro novas variedades tintas: Arinarnoa, Castets, Touriga Nacional e Marselan, com limite de até 10% no corte e 5% de área de vinha.
Os vinhos espumantes são, na grande maioria, blends. A região de Champagne, na França, identificou que as castas Pinot Noir e Chardonnay, temperadas com uma terceira variedade (no caso, a Meunier), davam origem a vinhos interessantes. O mundo inteiro levou adiante e tornou as duas as variedades “oficiais” dos espumantes. Os vinhos borbulhantes também levam na composição blends de safras, ou seja, utilizam uvas colhidas em diferentes anos. Isso é feito para manter o padrão da bebida anos após ano.
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Dica: Normalmente, as castas que compõem o blend aparecem no rótulo na ordem de predominância no blend. Por exemplo, o Salton Gerações Mário Salton é composto por 34% Tannat, 31% Marselan, 25% Merlot e 10% Cabernet Sauvignon.
Qual vinho é melhor: varietal ou corte?
Não existe uma resposta objetiva para a pergunta. A categoria não está associada a qualidade, mas sim a um estilo. Vinhos de corte tendem a ser mais equilibrados, redondos e prontos para o consumo. Como vimos anteriormente, a criação do blend nada mais é do que encontrar as uvas ideais para criar o vinho perfeito. Já os varietais exibem com maior clareza toda a expressividade da casta, com suas nuances de aromas e sabores. É um grande desafio para o enólogo, mas, quando encontra o caminho, consegue representar na garrafa toda a essência do terroir.
Para conhecer as diferenças das categorias, deguste lado a lado um varietal e vinho de corte, contendo a mesma uva do monocasta. Um exercício interessante é provar o Salton Desejo Merlot ao lado do Salton Talento, um blend com as uvas Cabernet Sauvignon, Merlot e Tannat. Identifique as características da Merlot no Salton Desejo e depois tente encontrar os mesmos pontos no Salton Talento. Assim você conseguirá perceber as nuances que aproximam os dois vinhos e descobrir qual o seu preferido.
Agora que você já sabe a diferença entre vinho varietal e de corte, entenda a diferença dos formatos das garrafas de vinho.