Enófilos e enólogos do mundo todo se rendem aos encantos das Vinhas Velhas. Afinal, não é para menos. Vinhedos antigos têm grandes histórias atreladas a eles. São vinhas que sobreviveram a guerras, pragas, disputas territoriais e estiveram por décadas expostas à ação climática e da natureza. E mesmo assim, permanecem ali. Gerando frutos e vinhos.
Escrito por Paula Daidone - Sommelière e especialista em marketing.
Assim como o nome sugere, Vinhas Velhas são plantações de uvas antigas. A idade para ser considerada uma vinha velha varia de acordo com a região. Na Europa, em que a produção de vinho é milenar, uma vinha é considerada antiga quando passa dos 40 anos. Já as novas regiões produtoras, videiras com mais de 25 anos são consideradas velhas.
Não há uma regra geral, lei ou se quer consenso para determinar a idade de uma vinha. Essa definição varia da qualidade da videira, da crença do enólogo ou até do marketing da vinícola. Na Espanha, por exemplo, acredita-se que a uva termina de se adaptar ao solo quando chega aos 15 anos e só depois disso começa a gerar grandes vinhos.
A Grécia detém uma grande quantidade de vinhas velhas, localizadas, principalmente, em Santorini. Muitos desses vinhedos tem produção ininterrupta e são cultivados desde sempre em pé franco (sem a utilização de porta enxerto). O vinhedo mais antigo da Grécia, e um dos mais velhos do mundo, tem 3500 anos e está ainda em produção.
Entenda o que é cultivo em pé franco
Já na África do Sul, os agricultores acreditam que aos 15 anos a parreira entra em declínio e suas uvas perdem a complexidade. Com a diminuição na qualidade das castas e baixo rendimento do vinhedo, os viticultores optam por arrancá-las e as substituem por videiras mais jovens e vigorosas.
A região de Barossa, na Austrália, é uma das únicas no planeta que tem regulamentação para o assunto. Por ser o lar de alguns dos mais antigos vinhedos em produção contínua do mundo – há uma parcela de Shiraz datada em 1847 -, a região instituiu em 2009 o Barossa Old Vine Charter, um registo das vinhas por idade. São quatro categorias: Barossa Old Vine, mais de 35 anos, Barossa Survivor Vine, mais de 70 anos, Barossa Centenarian Vine, mais de 100 anos, e Barossa Ancestor Vine, mais de 125 anos.
Vinhas velhas no Brasil
Aqui no Brasil não existe nenhuma definição ou regulamentação sobre Vinhas Velhas. Também não há registros oficiais de vinhedos com mais de 25 anos de idade. O que temos de informação concreta é que nos anos 30 foram iniciados os cultivos de uvas europeias na região de Bento Gonçalves. Infelizmente, muitos desses vinhedos já não existem mais. Alguns adoeceram por causa da filoxera e demais pragas e outros foram arrancados para dar lugar a mudas mais novas.
Esse foi um processo natural, de evolução da vitivinicultura brasileira. Anteriormente, eram plantadas uvas que tinham disponíveis ou variedades com fama comercial. Com o passar do tempo e a evolução de estudos e da tecnologia, os viticultores conseguiram identificar as cepas de melhor adaptação. Muitos vinhedos foram convertidos, principalmente na década de 90, quando houve um marco na modernização da viticultura brasileira.
Conheça a história do invenção do vinho
Dificuldades de cultivo das vinhas velhas
Cuidar de uma plantação de uvas antigas é muito mais trabalhoso e custoso do que cuidar de uma vinha jovem. Com o passar dos anos, as videiras tornam-se mais sensíveis e mais suscetíveis a doenças e pragas. As vinhas velhas também sofrem mais com as altas temperaturas e falta de água. Nos dias atuais, com as mudanças climáticas, esses vinhedos estão tendo mais dificuldade de sobrevivência.
Essa fragilidade reflete no cultivo. É necessário mão-de-obra especializada e, dificilmente, é possível utilizar máquinas nesses vinhedos. Quando calculado o gasto versus o rendimento, muitos viticultores preferem arrancar as vinhas. Pois o gasto para cuidar do vinhedo é maior que o rendimento dele. Parreiras com idade avançada geram uvas e cachos menores e mais concentrados. Consequentemente, uma produção menor. Uma vinha velha produz cerca de 10 vezes menos que um vinha jovem.
Mas quem arrisca manter um vinhedo velho, colhe bons frutos. E não estamos nos referindo apenas à qualidade das uvas. Levar a inscrição vinhas velhas no rótulo agrega valor ao produto. É um termo que o mundo inteiro traduz como exclusividade e está disposto a pagar mais caro por aquele exemplar.
Vinhas velhas geram uvas mais concentradas. Com isso, seus vinhos são mais exuberantes, com maior carga aromática, acidez equilibrada e taninos macios. São vinhos mais estruturados e complexos. Enólogos entusiastas do tema defendem que as vinhas velhas têm maior regularidade na produção, com menos variação entre as safras e tendem a atingir a maturação mais constantemente.
Mas é bom lembrar que a idade por si só não garante vinhos excepcionais. A vida útil de uma videira é medida de acordo com a qualidade das uvas e sua capacidade de produção. Para isso, é necessário que a plantação esteja saudável e bem adequada ao clima e ao solo, e as técnicas de condução, pode e manejo sejam realizadas de acordo com o perfil do vinhedo. É fundamental contar com uma equipe de profissionais altamente qualificada para poder acompanhar as vinhas de perto.