As lágrimas do vinho correspondem ao líquido que escorre pela parede da taça. Também chama de “pernas do vinho” e até de “vitral de igreja”, a forma que essas estrias de líquido correm pelo copo indicam as características do vinho, mesmo antes de levá-lo à boca.
Devemos observar a forma que as lágrimas escorrem, a quantidade formada na taça e a espessura de cada risco. Essa análise nos traz informações sobre idade, corpo e teor de álcool do vinho degustado.
Para analisar as lágrimas, devemos girar a taça com certo vigor, para que o líquido se espalhe por toda a parede da taça. O ideal é utilizar uma taça de bojo redondo, sem texturas e que seja incolor.
Escrito por Paula Daidone - Sommelière e especialista em marketing de vinhos
O que as lágrimas do vinho indicam?
A intensidade e a espessura indicam açúcar, álcool e corpo do vinho. Quanto mais álcool e açúcar tiver o vinho, maior o número de lágrimas, mais juntas e mais lentas elas descerão. Quanto menor a fração de álcool e açúcar, menor a quantidade de lágrimas, mais afastadas e mais rapidamente elas caem pela taça. Quanto mais lentamente a lágrima escorre, maior o corpo e o teor de açúcar.
Ou seja, caem mais rápidas quando o vinho tem menos álcool, menos corpo e pouca estrutura; e quando elas descem lentamente, significa que o vinho possui um teor de álcool maior, tem mais corpo e mais estrutura.
● Lágrimas rápidas, finas e em pouca quantidade - vinho leve, com pouca estrutura e menor teor alcoólico
● Lágrimas lentas, largas e em grande quantidade - vinho encorpado, estruturado e com maior teor de álcool
Todo vinho tem lágrimas?
Com exceção dos espumantes, é possível observar lágrimas em todos os vinhos. Mas como essas pernas são associadas ao teor de álcool e açúcar do vinho, vinhos com menor teor alcoólico ou menos açúcar podem não apresentar pernas perceptíveis quando agitados.
A falta de lágrimas não significa que o vinho seja ruim ou de qualidade inferior, pois as lágrimas não estão associadas à qualidade. A presença ou ausência de pernas de vinho não afeta fatores-chave que determinam a qualidade de um vinho, como aroma, perfil de sabor, acidez e estrutura de taninos.
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Como as lágrimas se formam
As lágrimas se formam através de um fenômeno chamado capilaridade, que é a propriedade física que os fluidos têm de subir ou descer em tubos ou extremidades. Na prática, o que acontece é que ao girar a taça, cria-se uma fina película de vinho na superfície do copo. O álcool, por ser uma substância volátil, em contato com o oxigênio, evapora deixando o líquido da parede composto apenas por água. Essa água se transforma em gotículas que, com a força da gravidade, escorrem pela taça formando os riscos, ou seja, as lágrimas.
Por isso os vinhos mais alcoólicos têm mais lágrimas, pois há maior volume de evaporação, consequentemente, sobra mais água. A temperatura e a umidade do local, assim como a taça, afetam muito o comportamento das lágrimas.
As lágrimas só ocorrem em contato com o oxigênio. Sacudir uma garrafa fechada não criará essa reação. Isso ocorre porque nenhuma evaporação está acontecendo. A evaporação é a chave para o aparecimento de lágrimas de vinho.
A interferência da taça nas lágrimas do vinho
A taça interfere diretamente na percepção das características do vinho e isso inclui as lágrimas. Para poder perceber com nitidez, é preciso fazer a degustação em uma taça de bojo arredondado, liso e incolor. É necessário que a taça esteja muito bem higienizada, sem resquício de detergente.
Caso a taça tenha alguma textura, as lágrimas não se formarão por completo e não conseguirão realizar o caminho de volta para a superfície do vinho. Assim como se a taça estiver suja ou com resquício de detergente, que fará com que as lágrimas se prendam no vidro e não consigam escorrer com fluidez.
Para que a higienização da taça não interfira na formação das lágrimas e, consequentemente, na degustação, é preciso que não haja nenhuma sobra de produto de limpeza. O ideal é lavar a taça apenas em água quente. Se for necessário adicionar detergente, utilize o neutro e apenas uma gotinha já é suficiente. Deixe a taça secar ao natural, mas, caso utilize um pano, prefira os de material que não solte pelinhos, como poliéster ou microfibra, para que não haja sedimentos presos no vidro.
A melhor taça para a análise das lágrimas do vinho
Como existem inúmeros modelos de taça, a mais recomendada para uma análise técnica é a ISO. Essa taça é reconhecida pela Organização Internacional de Padronização com o ISO 3591:1977 e segue padrões específicos de fabricação: deve ser feita de cristal transparente e liso, com, no máximo, 9% de chumbo, ter 15 cm de altura, sendo 10 cm de corpo e 5 cm de haste e base e capacidade para 220 ml.
Saiba o que são as leveduras do vinho
Ao fazer a degustação em uma taça ISO, mesmo com capacidade para cerca de 220 ml, o ideal é servir cerca de 50 ml de vinho, pois assim o líquido tem espaço para o movimento circular de agitação, o que proporciona o desprendimento dos aromas devido ao contato com o oxigênio. Esse volume também permite colocar o nariz dentro da taça, local de maior concentração dos aromas.
O modelo da taça ISO foi criado por Jules Chauvet, um enólogo de Beaujolais, na França, que, durante os anos 1950, se dedicou aos estudos baseados na teoria de que a relação entre volume e superfície de um copo teria uma ligação direta com o desenvolvimento de aromas. Chauvet chegou à conclusão de que a forma alongada do bojo (que ele se referia como ovo esticado), aliada às dimensões do copo davam condições ideias para a expressão aromática do vinho. Em 1977, o International Standards Organization (ISO) reconheceu o modelo de Chauvet como o padrão para a degustação de bebidas alcoólicas no geral.
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