A história do vinho e seu surgimento estão envoltos em diversas lendas, sendo difícil afirmar a origem real da bebida. Acredita-se que o vinho nasceu por acaso, quando alguém deixou um punhado de uvas em um recipiente e elas fermentaram espontaneamente. Mas cada cultura e região tem sua própria versão.
Escrito por Paula Daidone - Sommelière e especialista em marketing de vinhos
A mitologia grega associa o surgimento do vinho ao deus Dioniso, ou Baco na mitologia romana. O deus além de ser responsável pelo cultivo da uva, dominava a técnica de produção da bebida.
Os cristãos acreditam que Noé foi o criador da bebida. De acordo com a passagem bíblica de Gênesis 9:20-25, quando chegou ao Monte Ararat, Nóe se tornou lavrador e cultivou uma vinha. Com seus frutos, produziu uma bebida que o agradou demasiadamente, a ponto de se embriagar e ser encontrado caído no chão nu, precisando ser amparado por seus filhos.
Já os Cientistas remontam a história do vinho por dados arqueológicos, rastreados da ocorrência da espécie Vitis vinifera L. subsp. sylvestris, que seria ancestral de 99% das espécies de videiras viníferas atuais. Considera-se que há 8.000 anos tenham sido plantadas as primeiras vinhas cultivadas pelo homem. Essa datação refere-se a vinhas encontradas na região do Cáucaso, na Geórgia. No entanto, foram encontrados registros de videiras, com cerca de 20.000 anos, em um sítio arqueológico de Ohalo, região que atualmente faz parte de Israel.
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As primeiras prensas e equipamentos vitivinícolas foram encontrados na Armênia e datam de 4.000 a.C. Registros dos primeiros vilarejos construídos no entorno das plantações de oliveiras e videiras foram descobertos no Egito, datados em 3.000 a.C. Vêm também do Egito os registros das primeiras ânforas usadas para transportar e armazenar vinho. As ânforas foram utilizadas na logística do vinho até a Idade Média. Do Egito a viticultura propagou-se para a África, Itália, França, Espanha e Grécia.
A importância do vinho para as civilizações antigas
No Egito Antigo o vinho tinha um papel importante na religião e na vida cotidiana. Era utilizado em cerimônias religiosas, como oferendas aos deuses, e também apreciado como bebida pelos faraós e pessoas comuns.
Na Grécia Antiga o vinho estava muito associado aos pensadores. Era apreciado durante os simpósios, encontros sociais onde os homens se reuniam para beber vinho e discutir filosofia e política. Os gregos aprimoraram a produção de vinho, introduziram técnicas de cultivo de uvas e desenvolveram uma cultura sofisticada em torno do vinho.
Os romanos herdaram a cultura do vinho dos gregos e ampliaram a produção e o comércio de vinho em todo o Império Romano. Eles estabeleceram vinhedos em várias regiões, incluindo a Itália, França, Espanha e Alemanha, e melhoraram as técnicas de viticultura e enologia. O vinho era consumido em banquetes extravagantes e também era utilizado como moeda de troca.
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Durante a Idade Média, o cristianismo desempenhou um papel importante na preservação e disseminação do conhecimento vitivinícola. Os monges das ordens religiosas, como os beneditinos, cultivavam uvas e produziam vinho em seus mosteiros. Eles aprimoraram as técnicas de vinificação e mantiveram o conhecimento do vinho vivo durante os períodos de instabilidade e declínio da produção.
No Renascimento, entre os séculos XIV e XVI, houve uma redescoberta do conhecimento clássico e uma valorização do vinho. O vinho se tornou um símbolo de status e riqueza, e os vinhos finos eram apreciados por reis, nobres e cortesãos. Regiões vitivinícolas francesas famosas começaram a ganhar reputação, como como Bordeaux e Champagne. Os vinhos que estamos acostumados começam a aparecer nessa época.
A evolução da qualidade do vinho
Na antiguidade, o vinho não era feito apenas de uva. A bebida levava em sua composição uma mistura de ingredientes, como uva, mel e cevada diluídos em água. Essa mistura servia para dar sabor à bebida e também conservá-la por mais tempo. Há indícios também de que o azeite era utilizado como um conservante para o vinho. O óleo era derramado no recipiente para que criasse uma película protetora sobre o líquido. Muitos povos utilizavam o vinho com fins medicinais e misturavam à bebida ervas e especiarias.
A partir do século XIV, a atividade vitivinícola se orienta para a produção de vinhos de maior qualidade. Com isso, produtores começam a escolher com maior precisão os terrenos onde irão cultivar seus vinhedos, controlar o rendimento das vinhas e melhorar os processos de vinificação. É nesse período que nasce o termo terroir.
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Os Monges Beneditinos e Cisterciences, ambos da região francesa Borgonha, eram possuidores de grandes quantidades de terra na região e tinham condições ideais para observar a diferença de cada parcela e como as uvas vindas de cada área influenciavam no vinho final. Os monges passaram a demarcar áreas de acordo com essas características identificadas e chamar cada parcela de terroir. Algumas dessas marcações são utilizadas até hoje na Borgonha e foram elevadas ao nível Premier Cru e Grand Cru.
O vinho nas Américas
O século XV foi marcado pela descoberta da América. Em outubro de 1492, a expedição espanhola liderada por Cristóvão Colombo atracou na região das Antilhas em busca de encontrar uma rota alternativa para as Índias. As embarcações eram munidas de produtos de sobrevivência, incluindo vinho. A bebida era utilizada para consumo da tripulação e também usada como moeda de troca em negociações comerciais.
Como o vinho não aguentava as longas viagens da Europa até as Américas, os colonizadores decidiram produzir a bebida nas terras tomadas. As primeiras vinhas de uvas europeias chegaram por volta de 1500 e foram plantadas no México e no Peru. A trajetória do vinho no Brasil seguiu a mesma história: as videiras foram trazidas pelas expedições colonizadoras de Portugal.
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Em 1532, o português Brás Cubas deu início à produção de vinho em terras brasileiras. Plantou as primeiras vinhas nas encostas da Serra do Mar, no litoral paulista, mas as parreiras não vingaram, então transferiu a plantação para uma região onde hoje é o bairro do Tatuapé na cidade de São Paulo.
A cultura do vinho só foi chegar a outras regiões do país mais de um século depois. No Rio Grande do Sul, as primeiras videiras europeias foram plantadas em 1626, mas não conseguiram sobreviver por conta do clima. Só em 1875, após a crise da filoxera, é que a região conseguiu prosperar no cultivo de uvas. Os grandes responsáveis foram os imigrantes italianos que na mala, além de trazer as videiras de variedades do Vêneto, traziam o hábito do consumo do vinho como alimento. Isso fez com que a viticultura no sul se desenvolvesse.
A crise da filoxera
Entre os anos de 1850 e 1870, o mundo do vinho se viu diante de uma das maiores tragédias de sua história: a Filoxera, um pulgão que ataca a vinha. A praga teve início na região do Rhône, na França, e se espalhou por todo o planeta, devastando cerca de quatro quintos de todos os vinhedos do mundo. A crise se alastrou por doloridos 11 anos até que encontraram uma medida paliativa para acabar com a praga: enxertar as videiras de vitis vinifera sobre pés de vinha americana, pois essas eram resistentes ao pulgão, enquanto as europeias não.
A infestação foi um divisor de águas na produção mundial de vinho. Assim, muito do que conhecemos atualmente é resultado de estudos pós-filoxera. Atualmente, toda a produção de vinho e o cultivo de uvas é estritamente controlada, aliando o processo natural e biológico a novas tecnologias.
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